sábado, agosto 23, 2008

Esqueci o nome do texto

Toda aquela coisa complicada e sublime do amor na minha cabeça, e ele vem e me diz que tem vontade de me comer. Todos os "porquês" mal respondidos, todas as mágoas ainda latentes, e ele vem e diz que eu o deixo excitado sempre. Tanta saudade, tanta tristeza, tanta falta e ele vem e fala baixinho, no meu ouvido, o tanto que precisa, o tanto que quer e o tanto que vai.

Eu acabei de sair de uma desilusão amorosa daquelas de ficar de pijama sujo, se achando feia, preguiçosa e burra. De alugar Woody Allen pra sentir que alguém é parceiro das minhas neuroses. De quase me afogar em filmes românticos. De alugar filme americano burro para conseguir dormir pesado. De achar que um dia de Sol é uma afronta. De tirar de ouvido as notas tristes de uma música e depois cantarolar em sinfonias de "ais" doídos acompanhados de choros acústicos. De achar que uma janela, separada do chão por uma certa altura, tem seu sentido.

Mas ele não me deixa sofrer em paz, ele não me deixa ser feia, ele não me deixa virar bicho do mato. Ele aparece, sempre cheio das vontades e carinho, e me enche de feminilidade, me enche de vontade de ser mulher. E me aperta tanto que quase mata meu antigo amor. Minha cabeça pede tristeza para velar o defunto, minha alma pede silêncio para viver o luto. E ele aparece do nada e eu quase consigo sentir a mão dele caminhar e pedir, implorar, para que eu facilite um deslocamento para baixo. Ele quer encontrar seu destino e minha cabeça esquece de encontrar o meu. Meu coração bate sem vontade, impulsionado pela força dos suspiros fortes de tristeza.E ele quer agilizar, atropelar, explodir. É ele que me surpreende sem dar tempo de deixar para depois, sem dar espaço para a força da reação, sem dar som para a voz fraca da minha impossibilidade. Eu querendo chorar a última piada lembrada, eu querendo doer a última certeza da rejeição, eu querendo passar em claro as últimas sensações de amor zombado e ele, precocemente, me fazendo feliz. Meu desejo morto, assexuado, traído, quer viver de lembranças, dores e palpitações abandonadas.

Mas ele, com força, movimentos persistentes e ânsia inexplicável de tantos desejos, me vence, não pelo cansaço, mas por morte: ele enterra o meu eu apaixonado e faz renascer alguém limpa e virgem de defesas. Ele me quer branca e eu estou negra. Ele me quer inteira e eu estou esmiuçada em pedaços de amor quebrado. Ele me quer vem, vem, vem e eu estou tão vai, vai, vai. É o que ele me diz sem dizer, porque ele não diz nada para ter mais tempo de fazer. É o que ele me pede sem pedir, porque se ele pedisse dava tempo de eu fugir. Estou presa pelo prazer dele, estou derrubada pelo carinho dele, estou sufocada pelo desejo dele. Não estou em mim e me abasteço de outra vida. Sou sua hospedeira e sugo dele justamente o que ele tem de mais e eu de menos: desejo por mim.


(Tati Bernardi)

Nenhum comentário: