sábado, janeiro 16, 2010

Oi, quanto tempo! É, pois é, e lá se foi mais de 5 anos da última vez que nos vimos. Como você tá? Ah, eu tô bem, talvez eu esteja passando pela melhor fase da minha vida. Ah, você sabe, eu não sei dividir as áreas. Ou eu estou bem em todos os campos da minha vida, ou eu estou mais ou menos em todo lugar. É bacana ver que você finalmente aprendeu a escutar os outros. Vou aproveitar e falar bastante das coisas que você não teve tempo de saber antes que tudo volte ao normal. Escuta aí,

Eu tô namorando, sabe? O Airton. Um cara bacana, o cara mais bacana que eu já conheci, e estranhamente, as vezes eu tenho a impressão que os meus amigos e familiares gostam mais dele do que de mim. Já tem mais de um ano, e as pessoas até hoje não acreditam que ele está me suportando por tanto tempo. Temos planos. Acredita nisso? Eu, agora faço planos. Quer dizer, eu e uma garota lá de BH que eu conheci na internet e que se tornou a minha melhor amiga. Fazemos planos juntos pra metade do mundo, não é inacreditável? Patrícia é o nome dela. Dizem por aí que eu virei mulherzinha, deve ser influência dela, que parece uma boneca. É, eu sei, não tem nada a ver comigo, mas é que sabe, eu cansei um pouco dessa vida de submundo, de luzes neon e jukebox o tempo todo. Sou do dia agora. Quem diria...

Continuo trabalhando com o que eu não gosto, mas ganho um pouco melhor agora, e fiz amigos de verdade no meu trabalho, o que me faz esquecer um pouco a merda de não ter saco pros pepinos alheios que eu tenho que descascar. Não acredito mais em deus, mas morro de medo dos espíritos. Vou começar a frequentar umbanda mês que vem, acho que me familiarizei com os colares.
Nessa você não vai acreditar, não pareço mais uma drag queen. Não uso mais maquiagem, não saio mais de casa parecendo uma árvore de natal e não uso mais salto. Pasme! Nem cabelo loiro, comprido e chapado eu tenho mais.

Lembra que eu sempre tive o dom pra escrever mas nunca o levei a diante? Pois é, agora eu boto no papel todas as minhas "inspirações mirabolantes", e olha, tem até gente que lê e gosta. Viciei no Caio Fernando, um escritor gaúcho que morreu de aids. Você conhece? Hum, acho que não, nem Clarice Lispector você conhece. Não, não tô te "tirando" de burro não. Eu sei que seu negócio sempre foi música. Aliás, tenho que te agradecer, suas influências musicais me acompanham até hoje, só filtrei e aprimorei um pouco mais de tudo o que você me ensinou.

Continuo branquinha, você sabe, vou morrer sem me tornar amiga das marquinhas de biquini. Tirei o piercing. Emagreci uns quilinhos aí, as pessoas dizem que é porque eu estou sendo bem amada, e amor emagrece. Pode ser, não lembro de ter sido tão bem amada assim, em toda a vida.

Desculpa, vamos mudar de assunto.

Meus pais estão bem, velhinhos com doenças de velhinhos, mas estamos juntos, o que é o mais importante. A Suzy morreu, tenho outro cachorro agora, o nome dele é Hugo. Coisa mais manhosa do mundo, embora digam que ele é apenas gay.

Continuo odiando gatos. E peixes. E caju.

Durante esses anos, fiz amigos por toda a parte do Brasil, até um amigo maranhense eu tenho, acredita? Ihhh, tantos amigos que você não teve tempo de conhecer. Rodrigo, certamente, iria te odiar. Você acharia a Talita uma mulher interessante, um mulherão, pra ser bem sincera. Mas eu também tenho as minhas dúvidas se ela gostaria de você. Aliás, pouca gente gostava de você, né? E muito menos gostavam da gente junto.

Michele continua namorando o Ronaldo. Vanessa teve uma filha e eu viciei mesmo nessa porra de cigarro, como você disse que aconteceria quando me viu fumando pela primeira vez.
Acho que só voltei ao Baratotal três vezes nesse tempo. É estranho, as pessoas me cumprimentam como se lembrassem da época em que eu era a "rainha da cocada preta" por lá. Mesmo que eu já não seja mais loira, nem mais tão perua, nem mais tão oferecida. Sei lá, acho que eu virei mulher. E isso deve chamar mais a atenção do que qualquer tipo de "putinha". Eles me paqueram mais agora, sabia? Mas eu não dou bola, já achei o peito certo pra dormir.

Faz tempo que eu não vejo o "pessoal daquele tempo", mas sempre que eu os via, eles me perguntavam de você. Eles sempre esquecem que o tempo passou. E pra dizer a real, eu tenho medo que você tenha esquecido também. Tenho medo que você continue com aquelas idéias erradas de que um dia a gente vai acabar junto e estrague a vida bacana que eu construí sem você.

Sabe, eu sofri muito no começo, mas hoje eu quase não lembro de como era a gente junto. As vezes bate uma nostalgia de quando éramos o casal da noite, e você encrencava com todos os caras que olhavam um pouco mais insinuante pra mim. Mas é como uma espécie de saudosismo da época em que eu era uma adolescentezinha fútil e achava que o mundo se resumia as minhas pernas grossas e minha barriga chapada. Não que eu tenha saudade, eu apenas acho graça lembrar do quanto eu mudei longe de você. Do quanto eu cresci sem você pra me achatar. Do quanto eu amadureci sem você pra me podar. Não, não estou te criticando. É o teu jeito de tratar as mulheres por quem você se apaixona. Essa coisa meio James Dean, que atrai pra logo em seguida afastar. Tem lá seu charme, gato. Deve ter um monte de garota morrendo por você nesse exato momento. Eu mesmo já achei o máximo, mas como eu disse em outros lugares, aprendi que bad boys só são bacanas em filmes, ao menos pra mim.
Tomei gosto pelos mocinhos. Finalmente descobri que eu mereço ser bem tratada. Pra ser mais clara, tomei gosto pela leveza que só a segurança proporciona. Cansei de andar na corda bamba. Aboli o salto pra andar com os dois pés no chão e olha, pela primeira vez, eu vejo flores no caminho.

E pra terminar, talvez doa um pouquinho em você, esse lance de mexer com os brios e tal, mas eu preciso dizer antes que a gente não se veja nunca mais,

Eu não lembro de ter sido tão feliz em toda a minha vida.



Ah, eu continuo morando na mesma casa. E continuo mal humorada, grossa e anti social. Portanto, eu espero, de verdade, que você nunca me visite.

É isso.

Hoje faz 10 anos que a gente se conheceu, e eu precisava te agradecer por tudo o que você me ensinou, e principalmente, por tudo o que eu aprendi sem você. Definitivamente, essa foi a melhor parte da nossa história.

Com carinho,

Fernanda.

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